O quadro de Nossa Senhora Mãe da
Divina Providência, venerado numa capela ao lado do altar mór da Igreja de São
Carlos ai Catinari, em Roma, é uma tela a óleo de Scipione Pulzone, pintor
renascentista da Escola de Rafael e que viveu no século XVI, entre 1550 e 1598.
Representa a Virgem Maria, trazendo em seus braços um menino, que seria Jesus.
Mas, observe que, diferente de Maria, o menino que ela segura nos braços não
possui a auréola na cabeça, símbolo de santidade. Será que o artista quis,
intencionalmente, dizer que ali está a humanidade, pela qual Maria intercede
junto à Divina Providência? Pulzone era essencialmente religioso e sua alma de
artista e de homem santo conseguiu retratar em sua obra um momento de êxtase da
ternura maternal. Ao pintar o quadro, destinado a uma família romana, jamais
imaginou que se tornaria objeto de tamanha devoção dos cristãos.
A devoção a Nossa Senhora, com o
título de Mãe da Divina Providência começou, verdadeiramente, lá pelo início do
século XVII. Conta a História que nessa época havia duas casas em Roma,
pertencentes aos padres Barnabitas. Uma, na Praça Colonna, dedicada a São
Paulo, e a outra, na Praça Catinara. Atendendo a uma ordem do Papa Alexandre
VII, que desejava ampliar a Praça Colonna, a igreja de São Paulo deveria ser
demolida. Preocupados com um belo afresco de Maria, existente na igreja, os
padres pediram ao arquiteto responsável pela demolição que preservasse o
afresco, transportando-o com cuidado para a nova residência. Muito comuns na
Itália, os afrescos são grandes quadros murais, pintados sobre gesso, ou
argamassa. Grandes Mestres da arte medieval, renascentista e barroca utilizaram
essa técnica, como Michelângelo e Rafael, por exemplo. Apesar do cuidado, o
afresco foi destruído ao ser transportado para seu lugar definitivo. O
arquiteto, tentando compensar a tristeza dos padres pela perda do imenso
quadro, doou uma obra do pintor Scipione Pulzone, que pertencia a seu acervo.
Tratava-se de um quadro de Maria, segurando nos braços um menino. Mal sabia ele
o imenso tesouro espiritual que trazia aquele pequeno quadro, medindo apenas 54
x 42 cm. Inicialmente, o quadro fora colocado na capela interna dos padres, na
nova casa. Aquela imagem de Maria ainda não tinha um nome.
Os padres Barnabitas
empreenderam, então, a grandiosa obra da construção de uma igreja em honra a
São Carlos Borromeu, Arcebispo de Milão, canonizado em 1610. São Carlos havia
sido grande amigo e incentivador da Ordem dos Barnabitas. Após 15 anos de
obras, os recursos começaram a faltar e ainda havia muita coisa a fazer. O
superior da comunidade, Padre Brás Palma, decidiu, então, fazer uma peregrinação
a pé até o Santuário de Nossa Senhora do Loreto (onde existe a pequena casa em
que viveu a Sagrada Família, após sua volta do Egito). Ele tinha a certeza de
que sua oração seria atendida e conseguiria recursos para terminar a obra.
A história continuou, já no
século XVIII. Em 1732, Padre Pietro Maffetti, pároco de São Carlos, teve a
idéia de colocar uma réplica do quadro de Nossa Senhora num local onde pudesse
ser vista e venerada pelos fiéis. Ele encarregou outro artista, o Irmão
Barnabita Pietro Valentini, de fazer uma reprodução do original. No dia 12 de
julho de 1732, o quadro foi colocado num pequeno corredor, que servia de
passagem aos religiosos ao se dirigirem do convento à igreja. Sob o quadro, Pe.
Maffetti mandou escrever o título: "Mater Divinae Providentiae", Mãe
da Divina Providência. A partir daí, a imagem de Maria passou a ter um título,
cuja origem é explicada pelas Irmãs Angélicas de São Paulo, num livreto da
Congregação:
Retornando a Roma, procurou o
Cardeal João Batista Lenie, solicitando ajuda para a construção da imensa
igreja, mas o Cardeal informou que seus recursos já estavam comprometidos com
outras obras. Padre Palma não desanimou e
redobrou suas orações, insistindo junto a Maria Santíssima, na convicção
de que ela deveria ser sua Providência. No ano seguinte, 1627, faleceu o
Cardeal Lenie e seus funerais foram realizados na igreja inacabada, dedicada a
São Carlos, no dia 4 de novembro, dia de sua festa. Mas, ao ser aberto o
testamento do cardeal, qual não foi a surpresa dos Barnabitas: o Cardeal
deixara boa parte de seus bens para o acabamento das obras da igreja de São
Carlos Borromeu!
“No ano de 1633, morreu, com fama de
santidade, no Mosteiro de São Paulo, em Milão (Itália), Angélica Joana Visconti
Borromeu, prima de São Carlos Borromeu, que foi Priora do Mosteiro; tinha
grande amor à Mãe de Deus e plena confiança em sua proteção. Na mesma época, a
Angélica Luísa Mariana Gonzaga escreveu a vida da Madre. Conta que as Angélicas
realizavam "uma solene procissão, para homenagear e glorificar a Doce
Soberana, Mãe da Divina Providência, sem a qual não se pode obter socorro ou
graças celestiais, tudo passando por suas mãos..." (Vida Venerável da
Madre Angélica Joana Visconti Borromeu, 1635). Essa procissão era feita no 6º
Domingo de Pentecostes, cuja oração era:
Ó Deus, cuja Providência... (ver 9º Domingo do tempo comum).
Havia uma imagem que representava
Maria, com o Menino Jesus, e era venerada como Mater Divinae Providentiae.
Encontrava-se no corredor do claustro, entre a cela da Priora e a dispensa. Não
ficava distante do confessionário e do coro, onde as Monjas ouviam as
pregações. A Ela eram atribuídas muitas graças alcançadas. Historicamente,
desde 1613, os padres Barnabitas tinham decidido colocar na torre dos sinos da
igreja de São Paulo, em Bolonha, uma estátua da Virgem, com o título de “Virgem
Bem-Aventurada da Divina Providência”.
Voltando à história da casa dos
Padres Barnabitas, em pouco tempo, o corredor onde estava exposta a cópia do
quadro ficou pequeno, devido ao grande número de fiéis que acorriam para
venerar a Bem-Aventurada Virgem. O Superior Geral dos Barnabitas na época, Pe.
Mário Maccabei, mandou transformar o local em uma capela, inaugurada em 28 de
junho de 1742. O grupo de fiéis foi aumentando e se transformou em Confraria,
aprovada pelo papa Bento XIV, em 25 de setembro de 1744. O Papa Gregório XVI a
elevou à categoria de Arquiconfraria, no dia 16 de julho de 1839. Muitos papas,
reis e príncipes se inscreveram na Arquiconfraria, mas quem mais se distinguiu
pelo zelo e devoção foi o papa Pio IX, que freqüentava a Igreja de São Carlos.
Em novembro de 1888, por um decreto do Cabido Vaticano, a imagem foi
solenemente coroada, incentivando, assim, sua veneração sob o título Mãe da
Divina Providência. A atual Capela de Nossa Senhora Mãe da Divina Providência,
na Igreja de São Carlos ai Catinari, foi inaugurada em 1848.
De acordo com o Calendário
Eclesiástico de 1914, sua festa passou a ser definitivamente celebrada no
sábado, antes do terceiro domingo do mês de novembro, como é feita até hoje nas
igrejas e capelas que a veneram como Padroeira.